Vânia e Cauê: Justiça Cível condena Médico e Hospital
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Em sentença do poder judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, segunda vara cível (primeiro juizado), a juiza Rosane Wanner da Silva Bordasch condenou o médico e o Hospital Mãe de Deus pelas mortes da minha ex-companheira Vânia e do meu filho Cauê.
Agradeço imensamente o trabalho do Dr. Jaques Alfonsin, meu advogado neste caso, pela sua visão humanista-social e pelo seu excelente grau de profissionalismo.
Torno público todos estes fatos, mesmo que me cause muita dor, em homenagem a vida pública da Vânia e a luta pelos direitos da mulher que muitas companheiras continuam trilhando. É uma homenagem também a família da Vânia que sempre estará no meu pensamento e no coração.
Que este exemplo de justiça sirva para fortalecer as lutas das mulheres e os direitos humanos e ajude a evitar novos casos como este.
Mesmo que seja na primeira instância e que estas perdas jamais poderão ser reparadas considero uma vitória importante e tenho a obrigação moral de divulgá-las.
As sentenças preliminares da justiça cível (junho de 2006) e do CREMERS(2003) podem ser baixadas nesta página.
Esta divulgação serve também para ficarmos atentos e vigilantes nos próximos passos da justiça e confiantes que, pelo menos neste caso, a justiça está sendo feita.
Marcelo D'Elia Branco
Barcelona 11 de julho de 2006
Baixe, no link abaixo, o arquivo com a sentença de condenação cívil do médico e do Hospital em 2006: (6 Mb)
Veja o Histórico
MÉDICO CONDENADO POR HOMICÍDIO CULPOSO TEM SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL POR 30 DIAS
(de 28 de outubro de 2003)
Condenado pela justiça criminal o médico recebeu branda punição do CREMERS
A Themis garantiu mais uma condenação no Caso Vânia Araújo, morta, ela e seu filho Cauê, em decorrência de erros médicos durante o parto. Em audiência do Conselho Regional de Medicina do RS (CREMERS), às 21h de ontem, 28 de outubro, o médico Ricardo Herbert Jones foi condenado, por unanimidade, a 30 dias de suspensão do exercício da medicina pela morte de Vânia Araújo e seu filho Cauê. O Conselho entendeu que o médico agiu com imperícia, imprudência e negligência durante o parto de Vânia, infringindo os artigos 29 e 69 do Código de Ética dos Profissionais de Medicina.
O caso obteve a primeira vitória ainda este mês quando o médico foi condenado na justiça criminal. A sentença proferida pelo juiz Paulo Roberto Lessa Franz, da 7ª Câmara Criminal do Foro de Porto Alegre, condenou o réu por dois homicídios culposos à pena de dois anos e quatro meses de detenção, substituída pela pena restritiva de direitos que determina a prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 20 salários mínimos a uma instituição beneficente.
Segundo a advocacia da Themis, a pena do CREMERS, de 30 dias de suspensão do exercício profissional, não faz jus à seqüência de erros médicos que foram comprovadas no processo ético disciplinar e admitidas pelos conselheiros que julgaram o caso. Para a Themis, tratou-se de uma medida paliativa, ou seja, condenou pelos erros concedendo uma pena que parece mais um período de férias.
A morte de Vânia Araújo, primeira coordenadora da Coordenadoria Estadual da Mulher do RS, e de seu filho Cauê configura-se como morte materna (morte de mulheres durante a gestação ou dentro do período de 42 dias após o término da gravidez, devida a qualquer causa relacionada com ou agravada pela gravidez ou por medidas tomadas em relação a ela, porém não devida a causas acidentais ou incidentais OMS). O caso consta nos anais da CPI da Mortalidade Materna do Senado e o dia de sua morte, 05 de outubro de 2000, e recebeu indicação de deputados estaduais para transformar esta data no Dia Estadual de Combate à Mortalidade Materna.
RESUMO DO CASO
Internada em 12 de setembro de 2000, para realização do parto no Hospital Mãe de Deus, Vânia Araújo Machado veio a falecer em 05 de outubro do mesmo ano, 14 dias antes do falecimento de seu filho Cauê. Ambos faleceram em decorrência de erros médicos verificados durante o procedimento obstétrico.
Vânia, 35 anos, iniciou o acompanhamento médico pré-natal em janeiro de 2000, sempre com o mesmo médico ginecologista, Dr. Ricardo Herbert Jones.
Durante todo o período da gestação, não houveram intercorrências, tendo Vânia apresentado uma gravidez saudável. Entretanto, é importante salientar que o referido médico é adepto de uma filosofia que intitula de "parto humanizado", baseado em experiências ainda não cientificamente comprovadas, e alega atuar "sem excesso de intervenções desnecessárias de qualquer natureza" (sic depoimento prestado à Sindicância Interna do Hospital, realizada por ocasião da morte de Vânia e seu filho).
Por ocasião do trabalho de parto, o médico responsável forçou a situação para que o parto fosse realizado a qualquer custo de forma "natural", a fim de experienciar com a vida de dois seres humanos sua "teoria humanista perfeita". Durante o procedimento, não utilizou os equipamentos necessários e disponíveis, nem sequer deu a atenção devida para a monitoração dos batimentos cardíacos ou verificação da pressão arterial da mãe e do bebê, procedimentos obstétricos de rotina. Entretanto, o parto começou a apresentar problemas, tendo a paciente apresentado, de acordo com os fatos apurados pela Comissão de Sindicância do Hospital: "(...) Disfunção ativa no período pélvico. Indícios de ausência de descida de apresentação cefálica. (...) Distúrbio de demora ou de parada não identificado ou não valorizado. Impossível determinar o tipo de disfunção por não haver registro de Partograma. Com dilatação completa em torno de 10h30 e não tendo havido descida de apresentação, dever-se ia, ou firmar diagnóstico de desproporção céfalo pélvica (DCP) e indicar cesariana, ou estimular a contratilidade uterina com ociticina" (sic).
O procedimento cirúrgico, a cesariana, sempre deve ser decidido em minutos, mas o médico levou mais de três horas para tomar a decisão de retirada do bebê. Contribuíram ainda o prolongamento do sofrimento a demora do médico assistente em chamar um médico anestesista, uma vez que não havia tal especialista à disposição na equipe, e o fato de não ter sido providenciado um pelo Hospital quando solicitado, mesmo em face da urgência e do diagnóstico de sofrimento fetal agudo.
Após a cesariana, e provavelmente devido ao fato de a mesma ter sido realizada "em menos de meio minuto" (conforme depoimento do próprio médico ginecologista), a paciente ficou com restos placentários.
Os procedimentos médicos desencadearam uma série de doenças, sofrimentos e conseqüências fatais que poderiam ter sido evitadas se o médico tivesse tomado as medidas necessárias.
Diversos outros fatos apontaram ainda a culpa do médico na morte do nascituro, por imperícia, negligência e imprudência, entre os quais:
o sofrimento fetal agudo não foi diagnosticado em tempo hábil para a retirada do bebê sem as seqüelas que apresentou (em especial asfixia grave);
indícios fortes de que não houve adequada valorização dos sinais clínicos que sugeriram a possibilidade de sofrimento fetal há pelo menos três horas antes da indicação de cesariana.
Estas e outras evidências indicam a morte materna e neo-natal, tendo ocasionado uma Representação Criminal junto ao Ministério Público Estadual para apurar-se a responsabilidade criminal dos médicos envolvidos, além de representação junto ao Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul para instauração de processo ético disciplinar.
As representações foram encaminhadas pela Themis-Assessoria jurídica e Estudos de Gênero, a pedido de Marcelo D´Elia Branco, companheiro de Vânia e pai de Cauê, que foram aceitas pelo Ministério Público, que ofereceu denúncia contra o médico, a qual foi recebida pela Justiça.
Em abril de 2002, o juiz de direito da 7ª Vara Criminal recebeu denúncia por homicídio culposo contra o médico por ter o mesmo agido com negligência, imperícia e imprudência, não observando as regras técnicas da profissão durante o parto de Vânia e seu filho Cauê, sendo o médico condenado criminalmente por dois homicídios culposos neste mês de outubro de 2003.
O caso Vânia Araújo consta nos anais da CPI da Mortalidade Materna do Senado Federal. Este é um dos casos que exemplificam os dados alarmantes, com relação a esta problemática, que indicam que mais de 90% das mortes poderiam ser evitadas se as gestantes tivessem tido um tratamento digno e se cuidados por vezes elementares- fossem tomados pelos profissionais.
Baixe, nos três links abaixo, a sentença do CREMERS:
Aqui mais informações sobre o caso e homenagem de aniversário
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