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Correio Braziliense

29 de Janeiro de 2008, 0:00 , por Software Livre Brasil - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Escute aqui, em mp3, entrevista na rádio Bandeirantes sobre o evento.

“P2P não é crime”

Entrevista que dei ao Correio Braziliense, leia o que saiu publicado no jornal hoje:

"Marcelo D'Elia Branco trabalha como consultor de tecnologia para a sociedade da informação. Gaúcho, é uma das principais autoridades em software livre no mundo. Um dos fundadores do “Projeto Software Livre Brasil”, ele acredita que o governo deve encarar o assunto como questão base para o desenvolvimento de uma sociedade mais democrática, com livre escolha de padrões.

Depois de uma temporada na Espanha, traz para o Brasil o maior encontro de comunidades de internet da história, a Campus Party.

*Antes ele falou ao Correio sobre temas relacionados ao evento, como as tendências da nova economia digital, direitos autorais, licenciamento de software, desenvolvimento de uma nova indústria digital e o grande link entre todos esses assuntos: a internet, que, segundo ele, não é uma rede de computadores, mas de pessoas.

Confira os melhores momentos da entrevista com o consultor e diretor da Campus Party Brasil.

Revolução virtual

Nós estamos vivendo um novo período de grandes transformações nas formas de relacionamento. Então a mídia e o marketing tradicionais também precisam mudar a forma de se relacionar com o público da internet, pois os meios tradicionais já não conseguem alcançá-los. Isso porque as instituições que existem hoje foram criadas a partir da Revolução Industrial. No entanto, a sociedade não está mais se relacionando da mesma forma, agora estamos sob a influência da Revolução Digital. Essa diferença faz elas perderem poder de interlocução com a população.

A Campus Party é uma oportunidade para a nova mídia descobrir como se relacionar com esse público de 50 milhões de internautas.

Diversidade

Eu conhecia muito a realidade da comunidade de software livre no Brasil e o seu reconhecimento é bastante divulgado, mas eu não sabia que o Brasil era também apreciado na área da robótica, de games para PC, na área de simulação de vôos comerciais e combates aéreos — sejam as aeronaves americanas, japonesas ou alemãs. Nós somos muito bons nisso. Na música digital também: as principais casas do mundo, como o Buddah Bar e o Nirvana Lounge, são comandadas por DJs brasileiros, ao som de muita música tratada digitalmente. No entanto, os brasileiros não reconhecem isso. Temos a auto-estima muito baixa, na verdade, não temos estima nenhuma.

Indústria digital

Os poderes público e privado precisam reconhecer esse potencial brasileiro, já conhecido no exterior. Ver que o povo e a academia têm demonstrado que a gente sabe navegar como ninguém, e que a gente pode transferir esse conhecimento para a área da economia, para o desenvolvimento científico e tecnológico e fazer com que o Brasil dê um salto no século 21 e dispute a liderança no cenário do desenvolvimento econômico e sustentável.

Se nós perdemos a corrida da Revolução Industrial lá atrás, poderemos ser líderes na corrida para a nova sociedade em rede.

Estamos com apenas 14, 15 anos dessa revolução e três regiões do mundo se destacam na disputa, apesar de terem três modelos sociais bem distintos. As escolhas diante da tecnologia é que vão determinar o modelo social e não o patamar de desenvolvimento. Todos os países têm como prioridade transitar o mais rápido possível do modelo industrial para a sociedade em rede porque os que chegarem depois serão os subordinados do século 21. Todos eles têm uma política de migração para a sociedade da informação, que eu prefiro chamar de sociedade em rede, pois é o que diferencia essa revolução da industrial: a possibilidade de conexão global. O país que atingir esse patamar de desenvolvimento primeiro será o líder. A região líder é a Finlândia, que foi um país subdesenvolvido na Revolução Industrial, mas é o primeiro da nova sociedade em rede. E isso tem produzido resultados. Eles conseguiram uma alta taxa de produtividade, um crescimento econômico elevado, nível de educação excelente, graças a essa transição. Eles reproduzem o modelo social clássico da Europa pós-guerra, bastante democrático que visa o bem-estar social. Em seguida vem o Vale do Silício, na Califórnia, que reproduz um modelo extremamente autoritário e completamente individualista, onde as regras comerciais se sobrepõem aos direitos do cidadão. Tudo é patenteado, criminalizado, cheio de senões. E a terceira região é Singapura, onde praticamente todos os cidadãos estão conectados. No entanto o país vive uma ditadura. Quero dizer que três líderes com modelos sociais distintos se destacam e o Brasil também pode se destacar.

Criminalização da rede

A coisa pior que nós poderíamos estar fazendo é exatamente o que acontece hoje. O país começa criminalizando a internet no lugar de pensar em termos do direito do cidadão.

Com a nova lei dos crimes na internet, o cidadão não tem escolha sobre qual sistema operacional ou formato de arquivo utilizar, por exemplo.

Isso porque a esfera pública obriga ele a comprar o produto da Microsoft ou piratear, já que o formato utilizado pelo governo pertence a essa empresa não segue o padrão público internacional. Isso é exclusão.

Direitos autorais

O tema novo que surge como uma das grandes questões gira em torno dos direitos autorais.

No século 20 se formou toda uma indústria intermediária que gerenciou o contato entre o produtor intelectual e o público final. A indústria fonográfica, cinematográfica e do software, por exemplo, transformava o conteúdo intelectual (seja música, filme, software), juntava com a matéria-prima, somava o processo industrial e a distribuição. Isso era algo caro, que justificava a proteção ao produto final. Então, criou-se esse conjunto de regras de proteção para que essa indústria existisse.

No entanto, a revolução digital e a internet transformaram essa intermediação em algo, talvez, supérfluo. O grande papel dela era para cópia e distribuição. A internet faz cópia e distribuição sozinha. A grande questão é que essa indústria quer bloquear essa possibilidade que a rede está nos oferecendo. Ela tenta barrar o relacionamento entre o produtor intelectual e o grande público. Hoje, essa indústria intermediária tenta acionar, por meio de lobbys para criação de leis restritivas, mecanismos de controle da internet.

Mas eles não estão tendo êxito, por isso sempre vêem a internet como ameaça.

Nós não podemos confundir cópia privada com pirataria. Eu não aceito essa idéia de que as pessoas que estão descarregando música para uso pessoal, fazendo cópias privadas, sejam consideradas contraventoras ou criminosas.

Quando eu comprava um vinil eu tinha direito de passar ele adiante. Então é inadmissível que, depois de uma brutal revolução tecnológica, eu perca esse direito e seja considerado um criminoso por fazer a mesma coisa de antes, mas por um veículo chamado internet. Aliás, se essa mídia é imaterial eu deveria ter o direito maior ainda, pois nada foi gasto para que eu fizesse a cópia. Eu não estou falando da venda ilegal de música pela internet, mas sim da transferência P2P? (Peer to Peer — em português, pessoa a pessoa). João tem uma música no seu computador e pode deixar disponível para que Manuel descarregue e escute. Eu não considero isso crime. Considero um dos direitos e princípios básicos da internet.

Essas questões precisam ser discutidas publicamente e eu creio que, dependendo do nível que ela for regulamentada na legislação e nas regras da sociedade brasileira, determinarão se nós viveremos em um país mais ou menos democrático. Se vamos chegar ao nível de Cingapura ou da Finlândia. Se o Brasil vai trabalhar com seu sistema público de informática com software fechado ou livre. Se o sistema de dados do Brasil será tipo wikipedia ou biblioteca fechada, sem acesso da população. Para vigorar esse sistema colaborativo de compartilhamento do conhecimento criado pela internet não basta informatizar a sociedade se não estiverem, acima de tudo, os direitos do cidadão.

Economia

Sob o ponto de vista do desenvolvimento econômico, esse tema deveria ser tratado como política pública no Ministério do Desenvolvimento. Isso é uma falha do governo Lula. A política de inclusão digital não pode ser desconectada da política industrial.

Acho que ainda existe uma lacuna dentro do que se tem feito para inclusão, pois onde é que estão os clusters de inovação de empresas pequenas e médias? Onde estão os editais que o governo está abrindo para contratar empresa de software livre para prestar serviços? Ainda há uma desconexão. A política de exportação de software, por exemplo. Na verdade, deveríamos ter uma política para bloquear ou diminuir o tanto que nós importamos de licença de software desnecessariamente. Pagamos anualmente US$ 1 bilhão em royalties de licença de software. Num mercado interno que movimenta US$ 3 bilhões. Ou seja, um terço do que movimentamos é mandado para fora.

Software livre

Tudo que faz a internet funcionar hoje não foi criado por nenhum governo nem por empresas. O protocolo IP, o WWW, o e-mail, tudo isso foi desenvolvido pelos próprios usuários. Primeiro pela academia, depois pelo cidadão. E tudo isso é domínio público, código aberto. Ninguém paga royalties, nem patentes e olha a possibilidade econômica proporcionada pela web. A internet hoje é o grande software livre.

Se as pessoas pensam que o GNU Linux é o grande exemplo de êxito, eu digo que não. Hoje, para mim, o software tem que ser uma plataforma que agregue valor ao negócio e não o cara ficar vendendo licença. Exportar é vender licença. Então o Brasil tem que ser muito bom em serviços. Mudar um pouco a ótica da política industrial.

Políticas de Inclusão

Tenho um pouco de crítica a essa política de exportação do governo. Mas acho que o programa de inclusão digital do país vai muito bem. As iniciativas do computador conectado e do PC para Todos, quando vendemos um monte de máquinas, foram um sucesso reconhecido mundialmente.

E o Brasil tem que continuar investindo no software livre, não podemos ceder à pressão da indústria que quer mudar essa política. Somos reconhecidos internacionalmente por termos bancado essa política na área educacional e de inclusão digital. Temos que doutrinar essa nova geração a poder escolher. E não usar o produto de uma determinada empresa porque é a única opção.

[1] http://www.campusparty.com.br/

Fonte: Correio Braziliense - e portal Software Livre .org

Veja a imagem da Matéria do Correio Braziliense:

  • Correio:
    correio.jpg

Fonte: /bin/view/Blogs/BlogPostMarceloBranco20080129212905

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