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Depoimento de Carlos Ferrer, amigo de Che Guevara

27 de Novembro de 2011, 0:00 , por Software Livre Brasil - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Folha de S. Paulo de sábado

MINHA HISTÓRIA / CARLOS FERRER,82

Na estrada com Che

Amigo de infância do ícone revolucionário relembra viagem pela América do Sul com ele

(…) Depoimento a

LUCAS FERRAZ
DE BUENOS AIRES

RESUMO O argentino Carlos Ferrer, 82, conviveu com Ernesto Che Guevara durante 21 anos. Em 1953, fizeram uma viagem pela América Latina passando por Bolívia, Peru e Equador. Foi a segunda e última viagem dele pela região -a primeira, anos antes, foi feita com outro amigo, Alberto Granado, retratada no cinema. No final do giro, no Equador, os amigos se separaram.

Meu nome é Carlos Ferrer, mas todos me conhecem como Calica. Tenho 82 anos e tive a honra e o privilégio de ter sido amigo de Ernesto Che Guevara.

Conheci Ernesto em Alta Gracia, na província de Córdoba, em 1932. Ele, um ano mais velho que eu, tinha 4 anos. Alta Gracia tem um excelente clima para tratar doenças pulmonares, e como Ernesto era asmático, a família Guevara se mudou para lá.

O primeiro médico que o atendeu foi meu pai, que era especialista em vias respiratórias. Ernesto era inquieto, estava sempre pensando em fazer expedições pelas serras de Córdoba. Crescemos brincando no campo, praticávamos muitos esportes. Ele nadava muito bem e era um goleiraço no futebol. Também gostava de rugby.

Ainda criança, ele já tinha um sentido de justiça muito grande. Não deixava ninguém encostar nos irmãos, nos amigos, nem nos garotos gordinhos ou menos inteligentes, que são alvos de gozação em toda turma.

Lembro que perdemos a virgindade com a mesma mulher. Mas não estávamos juntos. Era um moça que trabalhava na minha casa.

Quase todos os dias, depois das aulas, Ernesto passava na minha casa e perguntava para minha mãe o que tinha para comer. Se gostava, ficava. Senão, ia embora.

A casa dos Guevara era especial, não havia horário para nada. Sempre se discutia muito, e parecia que todos estavam a ponto de brigar. Só não era permitido falar idiotices. Quando alguém falava ficava de fora da conversa.

Quando saímos de viagem em 1953, nosso objetivo era chegar até a Venezuela. Eu ainda estudava medicina, Che já era formado e tinha uma promessa de emprego.

Nossa viagem foi incrível. Sem dinheiro, passamos por Bolívia, Peru e Equador, sempre de carona. Logo no início, quando cruzávamos o lago Titicaca com um barqueiro, passamos um aperto terrível no meio de uma tempestade.

O barqueiro e eu ficamos desesperados, começamos a remar, eu tirei até as botas para pular na água, mas Ernesto nem se mexeu. Comentou: “Calica, a água está gelada. Se cairmos, vamos congelar”.

No Equador, estávamos em Guayaquil quando recebi uma proposta para jogar futebol em Quito. Resolvi ir por um trocado, não tínhamos dinheiro nem para comer.

Foi a última vez que o vi. Dividimos toda a bagagem. Ele ficou com as fotos e a câmera. Uma pena, pois logo depois ele perderia tudo em um naufrágio na Nicarágua, 95% das nossos fotos.

Havia algumas muito engraçadas, como ele fantasiado de toureiro. Eu iria voltar de Quito para encontrá-lo, mas não deu tempo, ele acabou pegando carona num barco de bananas e embarcou para o Panamá.

Depois de muito anos, quando eu morava na Venezuela, tive notícia pelo jornal, que dizia sobre uns rebeldes cubanos que estavam em Sierra Maestra, lutando contra o governo, e entre eles estava um médico argentino de nome Ernesto Guevara. Filho da puta, lá estava ele!

Tenho dois arrependimentos: não ter conseguido voltar para Guayaquil para continuar a viagem com ele, e de não ter ido depois para Cuba.

Mas destino é destino. Eu estava na Venezuela, ganhando dinheiro e me divertindo com hipódromos e as melhores mulheres do mundo. Entre mulheres rápidas e cavalos lentos, acabei ficando.



Fonte: http://blogdotarso.com/2011/11/27/5750/

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