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Ambientalistas não podem ser “massa de manobra” dos neoliberais. Veja texto da Carta Capital

2 de Janeiro de 2012, 0:00 , por Software Livre Brasil - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Camila Vallejo, líder estudantil no Chile

Carta Capital do dia 28 de dezembro de 2011

O vermelho e o verde.

Para a esquerda desenvolvimentista, o ambientalismo pode ser uma contestação mais séria que os neoliberais em retirada

Por Antonio Luiz M. C. Costa

O continente mais uma vez zombou dos prognósticos de fim de ano sobre o “refluxo da maré esquerdista”. O único país a se deslocar à direita nos últimos anos, o Chile após a eleição de 2009 e 2010, presencia um renascimento dos movimentos populares como não se via desde os tempos de Salvador Allende. Os protestos estudantis liderados pela universitária comunista Camila Vallejo mantêm em xeque, desde maio, o presidente Sebastián Piñera, com apoio de sindicalistas e da oposição. Sem dar respostas convincentes às reivindicações, o governo conservador perde popularidade com as ações repressivas, enquanto a despolitização da juventude chilena ao longo dos 20 anos de concertación é rapidamente revertida e as reivindicações de educação gratuita e desprivatização do ensino ganham apoio popular.

Ainda em 2010, a rejeição pela Corte Constitucional colombiana do projeto de uma terceira eleição consecutiva para o direitista Álvaro Uribe, aliado de grupos paramilitares, resultou na eleição de seu ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos. Mas este tem se mostrado um chefe de Estado muito mais pragmático, a ponto de Uribe sentir-se traído e cobrar da oposição venezuelana que critique seu sucessor por sua “amizade” com Hugo Chávez. Santos arquivou a retórica agressiva contra o Equador e a Venezuela e em troca recebeu a colaboração do presidente venezuelano na captura de militantes das Farc, cuja importância continua a diminuir e que recebeu um forte golpe com a perda de seu comandante Afonso Cano.

Viu-se também a justiça colombiana investigar e às vezes punir os crimes do uribismo e do paramilitarismo, a esquerda conquista a prefeitura de Bogotá e outras cidades importantes e os estudantes universitários obrigarem o governo, pela greve, a retirar um projeto de reforma da educação que abria as portas à privatização. Ali, se houve um movimento, foi na direção do centro.

O movimento mais notável de 2011 foi, porém, do centro-direita para o centro esquerda nacionalista: a eleição de Ollanta Humala no Peru. Foi particularmente significativo, pois as políticas neolibelo para o continente desde os anos de Alberto Fujimori. E o segundo mais importante foi a reeleição de Cristina Kirchner em outubro, que confirmou que continua a haver apoio popular às suas políticas heterodoxas apesar da manipulação dos índices para disfarçar uma inflação preocupante. Ambos contrariaram os prognósticos da The Economist.

O Brasil continua, com Dilma Rousseff, a seguir o caminho de política nacional e internacional aberto pelo governo Lula e a realidade geopolítica e geoeconômica não deixam muitas alternativas: quanto mais se intensificarem os laços com os países periféricos, latino-americanos, africanos e asiáticos, menos estragos fará a marola da inevitável segunda recessão (se não coisa pior) dos países do Atlântico Norte.

Se o Mercosul se tornou algo menos importante para o Itamaraty, é porque se tornou um entre outros elementos da mesma política, cujos eixos principais são hoje a Unasul, o G-20 e o BRICS.

Pode-se falar de certa convergência da América do Sul, se não da América Latina, para o centro-esquerda. Tanto os neoliberais tornam-se mais pragmáticos ou na investigar e às vezes punir os crimes do uribismo e do paramilitarismo, a esquerda conquistar a prefeitura de Bogotá e outras cidades importantes e os estudantes universitários obrigarem o governo, pela greve, a retirar um projeto de reforma da educação que abria as portas à privatização. Ali, se houve um movimento, foi na direção do centro. O movimento mais notável de 2011 foi, porém, do centro-direita para o centro esquerda nacionalista: a eleição de Ollanta Humala no Peru. Foi particularmente significativo, pois as políticas neolibelo para o continente desde os anos de Alberto Fujimori. E o segundo mais importante foi a reeleição de Cristina Kirchner em outubro, que confirmou que continua a haver apoio popular às suas políticas heterodoxas apesar da manipulação dos índices para disfarçar uma inflação preocupante. Ambos contrariaram os prognósticos da The Economist.

O Brasil continua, com Dilma RousB seff, a seguir o caminho de política naY cional e internacional aberto pelo governo Lula e a realidade geopolítica e geoeconômica não deixam muitas alternativas: quanto mais se intensificarem os laços com os países periféricos, latino-americanos, africanos e asiáticos, menos estragos fará a marola da inevitável segunda recessão (se não coisa pior) dos países do Atlântico Norte. Se o Mercosul se tornou algo menos importante para o Itamaraty, é porque se tornou um entre outros elementos da mesma política, cujos eixos principais são hoje a Unasul, o G-20 e o BRICS.

Pode-se falar de certa convergência da América do Sul, se não da América Latina, para o centro-esquerda. Tanto os neoliberais tornam-se mais pragmáticos ou cedem espaço a forças mais à esquerda quanto os governos mais à esquerda moderam sua retórica, como é o caso de Chávez, ou flexibilizam a ortodoxia stalinista e abrem espaço a pequenos empresários e transações entre cidadãos, como é o caso da Cuba de Raúl Castro. A crise financeira dos países ricos reforça essa tendência, na medida em que força os governos sulamericanos a se apoiarem uns nos outros e no comércio com outros países periféricos e dependerem menos dos EUA e Europa. Apesar de a Unasul não ter sido palco de grandes decisões em 2011, os vizinhos continuam a ser silenciosamente pressionados pela realidade a cooperar entre si. O ex-presidente uruguaio Tabaré Vázquez, ao recordar, não se sabe a troco de quê, suas fracassadas negociações por um acordo de livre comércio com os EUA e os atritos com o falecido Néstor Kirchner em relação às indústrias de celulose do Rio Uruguai, chegando a mencionar que chegou a cogitar de guerra com a Argentina, foi ridicularizado nos dois países e aparentemente encerrou sua carreira política antes do planejado.

Isso não quer dizer, porém, que tudo sejam flores no que se refere às políticas dos governos de centro-esquerda. O tradicional desenvolvimentismo capitalista dessa corrente na América Latina começa, pela primeira vez, a ser questionado não por ultraliberais que condenam políticas industriais, agropecuárias, de desenvolvimento ou qualquer interferência do Estado na economia, mas por forças de esquerda que procuram defender o ambiente e as minorias, principalmente os indígenas.

O conflito mais emblemático foi o do presidente boliviano Evo Morales com o movimento indígena do Território Indígena e Parque Nacional Isiboro-Secure (Tipnis). Uma estrada a ser construída pela empreiteira brasileira OAS, considerada importante para o desenvolvimento e a integração territorial da Bolívia, entre os departamentos de Bení (amazônico) e Cochabamba (andino), foi combatida pelos indígenas da reserva, que se estende pela divisa dos dois departamentos, com apoio de ambientalistas e de outros grupos indígenas das terras baixas da Bolívia, que culparam o “imperialismo brasileiro” pelo projeto.

O governo boliviano tentou desqualificar o movimento acusando-o de ser manipulado pelos EUA, tentou reprimir a marcha de protesto quando estava a ponto de chegar ao departamento de La Paz, mas não adiantou: os indígenas foram recebidos como heróis por boa parte da população da capital e se impuseram a Morales, forçado a atendê-los e a enviar ao Congresso um projeto de lei que declarou o parque “intangível”. O trajeto da estrada deverá ser mudado a um custo de 200 milhões de dólares.

O caso não deixa de ter ambiguidades. Ao menos 24 outras comunidades indígenas sentiram-se prejudicadas pela suspensão da estrada e protestaram contra a decisão, pedindo que a obra seja retomada. É provável que os EUA e a oposição realmente tenham encorajado a manifestação anti-Evo. E quando o governo decidiu levar a “intangibilidade”à risca,expulsando do parque

madeireiras e empreendimentos turísticos, os próprios indígenas do Tipnis protestaram, dizendo querer atividades econômicas sob seu controle. Por maiores que sejam as complexidades reais do caso, ele representa um dilema entre o desenvolvimentismo característico dos movimentos políticos de centro-esquerda na América Latina, de um lado, e de outro, os interesses ambientalistas e das minorias – mais visivelmente as indígenas, mas também descendentes de quilombolas e outras comunidades camponesas tradicionais -, que podem ser apoiados por forças conservadoras por razões oportunistas. mas não são necessariamente “de direita”, muito ao contrario. Conflito semelhante apareceu na tentativa de golpe contra Rafael Correa, no Equador, em setembro de 2010. Os policiais, que chegaram a invadir a Assembleia Nacional e a manter o presidente como refém dentro de um hospital, tiveram o apoio do ex-presidente Lúcio Gutiérrez (de tom mais neoliberal e mais próximo dos EUA em política externa) e, segundo o governo dos EUA, mas também da organização indígena Confederação de.Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), que seis meses antes rompera com o governo, rejeitando a Constituinte, reivindicando um “Estado plurinacional” e considerando nulas as “concessões e autorizações mineiras, petroleiras, madeireiras, serviços ambientais, farmacêuticos, hidroelétricos e mangues realizadas pelo Estado equatoriano em

nossas terras e territórios ancestrais”.

A Conaie e seu braço político, o partido Pachakutik, aceitaram apoio de agências dos EUA como a Usaid e o National Endowment for Democracy, mas também da frente de extrema-esquerda MDP, liderada pelo Partido Comunista Marxista-Leninista do Equador, afim ao Partido Comunista Revolucionário (PCR) do Brasil. Assim como o “capitalismo andino-amazônico” de Morales e o “socialismo do século XXI” de Chávez, a “revolução cidadã” de Correa quer impulsionar a exploração de petróleo e recursos naturais, processo que em geral favorece as classes populares urbanas que começam a emergir para o consumo – são hoje maioria e sustentam a popularidade desses governos, mas frustra as expectativas de grupos marginalizados mais tradicionais.

Conflitos semelhantes surgem no Peru, onde o novo governo de Humala enfrenta a continuação e o crescimento de protestos de comunidades indígenas contra projetos mineiros e hidrelétricos iniciados no governo anterior, que envolvem tanto empresas dos EUA quanto brasileiras. Na Argentina, o líder indígena e camponês Cristian Ferreyra, de uma organização ligada à Via Campesina, foi assassinado por latifundiários com aparente conivência de Gerardo Zamora, governador de Santiago del Estero e aliado de Cristina Kirchner, crime minimizado pela mídia governista. No Paraguai, a guerrilha do Exército do Povo Paraguaio divulgou em novembro um comunicado no qual ameaça exportadores de soja (em boa parte fazendeiros brasileiros) que utilizam agrotóxicos em seus cultivos por “destruir o ambiente e adoentar nossos irmãos camponeses”. O Brasil, obviamente, tem conflitos análogos, multiplicados pela extensão de seu território e diversidade de suas populações e somados à presença de empresas, sojicultores e capitais brasileiros nos países vizinhos. As disputas sobre o Código Florestal e a Hidrelétrica de Belo Monte e os assassinatos de camponeses e indígenas na Amazônia e Mato Grosso do Sul são apenas as frentes mais visíveis de contradições do desenvolvimentismo, que levam a alinhamentos tão atípicos quanto ao do líder do PCdoB com os ruralistas do DEM e do PSD ou do PSOL com artistas da Globo.

O debate facilmente cai no maniqueísmo, mesmo se raramente é claro o que é “direita” ou “esquerda” nesses casos. Um lado pode ser acusado de ser manipulado pelos EUA ou por ONGs estrangeiras a serviço da CIA e o outro de servir ao “imperialismo brasileiro” ou às transnacionais do alumínio e do agronegócio. Mas as contradições do desenvolvimento capitalista são reais: de fato há meada opção setores populares beneficiados e prejudicados, assim como elites nacionais e estrangeiras que ganham e perdem. E à medida que a crise dos países ricos enfraquece a ortodoxia neoliberal dos anos 1990 e a faz perder relevância nos palcos políticos e intelectuais, é possível que a questão ambiental aos poucos se torne o divisor de águas na política sul-americana.



Fonte: http://blogdotarso.com/2012/01/02/ambientalistas-nao-podem-ser-massa-de-manobra-dos-neoliberais-veja-texto-da-carta-capital/

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