Estarei aqui elucidando a atual situação da liberdade de software nas universidades públicas, em especial na Universidade Estadual Paulista, da qual sou aluno de graduação em Ciência da Computação.
Introdução
4 de Janeiro de 2010, 0:00 - sem comentários aindaAs Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) realizaram mudanças profundas em nossa sociedade nas últimas décadas. Possibilitaram várias formas novas de comunicação, entretenimento e documentação, além de outras relações econômicas, políticas e sociais, quebrando paradigmas de tempo e espaço e criando assim a chamada “Sociedade Digital”.
Uma das transformações mais efetivas possibilitadas pelas TIC está no ambiente educacional. Escolas, Diretorias de Ensino, Secretarias de Educação e o Ministério da Educação brasileiros foram informatizados e conectados à internet, criando assim maiores possibilidades de interação com alunos, funcionários e professores.
Em qualquer instituição voltada ao ensino atualmente é necessário o uso de computadores em âmbito administrativo, como ferramenta auxiliar no ensino e/ou como o objeto estudado. Seu uso proporciona agilidade, segurança, organização, conectividade, melhor desempenho, enfim, o ensino hoje é moldado pelas novas tecnologias e tende a criar novas formas de abstração, podendo assim ser utilizado no processo cognitivo de maneiras variadas.
Exceto aqueles que têm computadores como objetos de estudo, todas as pessoas deste ambiente relacionam-se com eles através de softwares. Softwares são criados para formar uma camada de abstração entre o usuário e o computador, alguns de aspecto geral como sistemas operacionais e outros específicos como navegadores, editores de texto, gerenciadores de correio eletrônico, etc.
Utilizamos intensamente vários tipos de softwares na universidade. Nos cursos de engenharia temos simuladores; em arquitetura usa-se os softwares de desenho em profundidade; em geografia e cartografia utiliza-se os Softwares de Informação Geográfica (SIG); na estatística, softwares para criação de gráficos. Por fim, para cada ciência existe ao menos um software para melhor processamento e/ou organização de dados, além dos mais básicos necessários para criação de artigos, bancos de dados, apresentações de slides e planilhas eletrônicas, utilizados por toda a universidade.
Porém tais softwares utilizados na universidade são propriedades de empresas, em sua maioria internacionais, as quais oferecem acordos de licença para usuários finais (End Users License Agreement – EULA) confusos, cobram preços abusivos para seu licenciamento, impedem o uso de seus softwares em outras localidades (nos computadores particulares dos alunos e professores, por exemplo), impossibilitam um ambiente de estudo e aprimoramento bloqueando o acesso ao código fonte de seus softwares, usam de vendor lock-in, além de outras atitudes que inviabilizam melhores condições para o aprendizado (objetivo principal de qualquer universidade).
Tal cenário exige estudos aprofundados referentes aos gastos, à manutenção desse sistema pela universidade (a qual deveria criar soluções melhores para a sociedade), à perda de oportunidades para criação de novos nichos de mercado locais, às ações de inclusão digital utilizando softwares proprietários, finalmente, às implicações econômicas, políticas e sociais da utilização de softwares proprietários nas universidades públicas.
Sobre a "Síndrome de Estocolmo Digital" existente no curso de Ciência da Computação da FCT
31 de Dezembro de 2009, 0:00 - sem comentários ainda"Síndrome de Estocolmo Digital" é um termo utilizado pelo professor Pedro Antônio Dourado Rezende da Universidade de Brasília, elucidado neste artigo de sua autoria (o qual tornou-se um capítulo no livro "A Revolução do Software Livre", editado pela Comunidade SOL):
http://www.cic.unb.br/~pedro/trabs/estocolmo.html
Algo muito semelhante ocorre entre boa parte dos alunos do curso de Ciência da Computação da FCT - UNESP.
Temos em nosso curso um grupo de discussão por e-mails (googlegroups) onde graduandos, professores e graduados recebem todas as mensagens ali veiculadas. Neste grupo acontecem discussões acerca da estrutura do curso, materiais de disciplinas, organização de eventos, etc. Em algumas situações discute-se também sobre a aquisição de licenças de software pela universidade e, por conseguinte, discussões sobre maior adoção de softwares livres.
Nestas raras ocasiões percebo uma forte defesa dos alunos em favor dos softwares proprietários. Alunos que tiveram durante sua graduação aulas, palestras, mini-cursos, workshops, etc. explicitando as mazelas da adoção de tais softwares (principalmente em uma universidade pública e em uma faculdade com a maioria de cursos voltados à licenciatura) com argumentos infundados do tipo: "[...] se fosse tão ruim assim, não teriam tantas pessoas utilizando [..]", ou "[...] vivemos num mundo capitalista! Quem não quer ficar rico?! [..]". associações dos conceitos de software livre ao marxismo, enfim, visões sectárias da realidade.
Quaisquer tentativas de debate neste sentido acabam com a "cruscificação" daqueles que defendem uma maior independência digital da faculdade, além de posterior intitulação de "idealistas utópicos".
Acredito que o método de ensino segmentado utilizado na universidade é um catalizador para atitudes deste gênero. Profissionais são formados completamente ignorantes das implicações políticas, econômicas e sociais de seu futuro trabalho. O "afunilamento" do conhecimento existente nas faculdades "atrofia" a reflexão a respeito de nossas opiniões refentes a outros ramos da ciência.
Tenho conseguido demonstrar com maior facilidade à alunos de outros cursos as vantagens no uso de software livre, os quais, na maioria das vezes, nunca depararam-se com tais definições.
A mudança de pensamento dos alunos da Ciência da Computação será demorada e gradual, porém creio que será definitiva, e seremos nós que ofereceremos treinamento e conscientização aos demais.
"A compreensão é a chave do entendimento, da convivência pacífica e da liberdade." (Luiz Márcio M. Martins)
Alguns comentários sobre a situação na FCT
31 de Dezembro de 2009, 0:00 - sem comentários aindaTemos cerca de 180 alunos no curso de Ciência da Computação, porém temos apenas 3 professores em dedicação integral com formação específica em computação. Fica clara nossa deficiência de opções para Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC's), projetos de iniciação científica ou extensão universitária, afinal, para qualquer dessas atividades é necessário um docente para nos "orientar".
Sem um orientador interessado não conseguimos acesso a documentos, ofícios, contratos, etc. com as informações necessárias para conhecimento e cálculo exato dos gastos com licenças de software em nossa universidade. Não temos também prestígio perante as várias instâncias para iniciar um debate sobre o assunto com professores e funcionários.
Nosso curso tem atualmente 2 laboratórios de uso exclusivo e acesso a todos os alunos do curso, com cerca de 35 computadores cada. Desde meu ingresso na faculdade (2007) até março de 2009 estava instalada a distribuição GNU/Linux Debian, além do Microsoft Windows XP. Porém, esta instalação Debian se mantinha desatualizada, sem os plugins multimedia (codecs, flash, etc) instalados, enfim, sem qualquer atrativo para os alunos o utilizarem em seu dia-a-dia. Como não tínhamos acesso a senha de administrador (entregue apenas aos monitores) para modificarmos ao nosso gosto, não era viável sua utilização.
Em março de 2009 foi feita a instalação da distribuição Ubuntu com mais recursos.
Para os outros 11 cursos da faculdade temos um Laboratório Didático de Computação (LDC) com 45 computadores aproximadamente, onde está instalado apenas o Microsoft Windows. Muitos alunos não possuem outra forma de acesso a um computador senão no LDC, logo, muitos fazem seus trabalhos acadêmicos neste laboratório. Nenhum desses computadores tem instalado uma suíte de escritório que manipule padrão de arquivos aberto (ODF). Não tenho conhecimento ainda sobre os grupos de pesquisa, salas de professores, setores administrativos e direção devido a falta de "poder de acesso" a essas informações.
Existem também dois locais na faculdade onde podemos imprimir nossos arquivos. Os dois pontos são matidos por empresas privadas licitadas e são muito frequentados pelos alunos. Em nenhum deles existe algum programa para leitura de padrões ODF.
Enfim, em relação a arquivos criados em suítes de escritório (cerca de 70% das atividades realizadas na universidade), é praticamente impossível a utilização de software livre ( claro que Openoffice e derivados também manipulam arquivos com as extensões do Microsoft Office, porém com alguns problemas de compatibilidade, os quais inviabilizam a criação de trabalhos acadêmicos ).
"Só percebemos as correntes que nos prendem quando nos movemos, do contrário, nos parece confortável..." (autor desconhecido)
Apresentação
30 de Dezembro de 2009, 0:00 - sem comentários ainda
Este blog será utilizado para documentação de um projeto pessoal realizado por mim, Alexandre Silva Parmindo, aluno do quarto ano do curso de graduação em Ciência da Computação da Faculdade de Ciêcias e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (FCT - UNESP), localizada na cidade de Presidente Prudente - SP.
Este é um projeto criado com o intuito de elucidar os conceitos de liberdade de software, apresentar um breve histórico de como surgiram tais conceitos, as vantagens no uso de tais softwares (e desvantagens na manutenção dos softwares proprietários), estudar o atual estado da Faculdade de Ciências e Tecnologia acerca do uso de softwares, apresentar razões para uma possível migração usando softwares livres, criar uma metodologia para a migração nos setores cabíveis além de fomentar o debate nos órgãos colegiados sobre este que tornou-se um assunto crucial nos principais setores de nossa sociedade.
Existe hoje um quadro de dependência gigantesco nesta universidade, e acredito não ser apenas no campus de Presidente Prudente. Atualmente se encontra impossível a utilização de padrões de documentos abertos (ODF) pelos alunos da FCT, não ocorre nos órgãos colegiados uma discussão acerca do assunto, não são criadas propostas de contabilidade dos gastos com licenciamento de software, enfim, não existe qualquer tipo de atuação para tornar claras as implicações do uso de software proprietário em nossa faculdade.
Exporei as discussões realizadas com alunos, professores ou funcionários e seus resultados, além de demonstrar (se existirem) quais argumentos serão utilizados para inviabilizar este projeto.
Desde já agradeço àqueles que me ajudaram a iniciar este trabalho e aos futuros apoiadores.
"Não devemos acreditar na maioria que diz que apenas as pessoas livres podem ser educadas, mas sim acreditar nos filósofos que dizem que só as pessoas educadas são livres." (Epiteto)