Cinco jornalistas, câmera e roteiro nas mãos. A partir do dia 4 de agosto desembarcamos na Bolívia para produzir um web-documentário. Serão mais de 40 dias rodando o país em busca de personagens e respostas que norteiem o cenário das principais propostas e ações políticas do governo Evo Morales com destaque para quatro temas da atual agenda pública de debate boliviano: a ação do movimento cocalero e a disputa de terra, a ação do movimento dos mineradores e a luta pela exploração do solo, a política de nacionalização dos hidrocarbonetos e a aprovação da nova constituição do país. Acompanhe aqui nossa trajetória.
Sem desgrudar
20 de Agosto de 2007, 0:00 - sem comentários ainda
Essa é uma imagem repetida aqui no blog. Já passaram mais de 15 dias que desembarcamos na Bolívia e, mesmo assim, sempre me prende atenção quando vejo as mulheres com o filho nas costas. São as mulheres de origem indígena e esse pano colorido chama aguayo.
O bebê fica aí dentro no maior conforto. O dia todo junto com a mãe pra cima e pra baixo. Mercado, ônibus, praça. As que trabalham como ambulante vendendo suco de laranja ou qualquer outra coisa na rua também levam o filho nas costas.
Raramente ouço algum tipo de choro e muitas vezes vejo as mães ninando o bebê com o leve movimento de inclinar os ombros para o lado em contínuo vaivém.
Mas "mordomia" dura só até os cinco anos de idade. A partir daí, creio eu, não tem mãe que aguente carregar o rebento nas costas por mais que haja amor. Na foto ao lado, o chiquito saboreia uma mamadeira de chá de coca, outra peculiaridade da Bolívia.
¿Roubo?
16 de Agosto de 2007, 0:00 - sem comentários ainda
Direto de Cochabamba - No centro da cidade, caminhando de volta ao alojamento, percebo uma puxadela em minha mochila. Viro indignado, e dou de cara com um moleque de uns quinze anos que tentava me abrir a sacola com muito pouca cerimônia. Pego no flagra, o menino nao saiu correndo. Levou as maozinhas sujas à cabeça embonezada e gritou repetidas vezes, desesperado: "No te robé nada!" Cerquei-o por uns instantes, mas deixei-o passar.
Ao final, duas canetas no chão e um instantâneo da violência local. Incipiente, mas ainda chega lá (vocês sabem onde). A depender do crescimento urbano desordenado em direçao ao sul da ciudad, em breve a miséria dará seu grito, e nao será de desculpas. Nem estarao as maos vazias.
A Globo, direto da Pampa
16 de Agosto de 2007, 0:00 - sem comentários aindaTransplantado de uma beira de estrada do interior da Bahia diretamente para os arredores de Santa Cruz de la Sierra - a cidade mais rica da Bolívia -, o humilde distrito de Pampa de la Isla comemorou seu não-sei-quantésimo aniversário no domingo passado. Santa Cruz é uma cidade metida a moderninha, urbana-emergente, mas o pessoal da Pampa ainda conserva sua simplicidade tímida, típica de que vem lá do sertão e pode não agradar. Por lá, como nos bares chiques da cidade, também se escuta "reaggaeton", uma aporrinhante batida portorriquenha. Com a diferença de que as ruas são de barro e as casas de tijolo à mostra, como o lixo na porta.
Como bom sertanejo, o povo recebeu e aplaudiu, empolgado, a umas boas duas horas de discursos de gente importante e engravatada. Em cada fala, cupinchas da administração e do empresariado local não perdiam a oportunidade de malhar um pouquinho o governo de Evo Morales e pregar um discurso separatista de autonomia. No fim, do próprio prefeito, promessas de um novo hospital para o vosso-reino, em troca de aplausos, sorrisos e mais todo aquele venha-a-nós. Conservando o costume antigo do sertão, em Santa Cruz o povo ainda diz amém.
Disfraçados de jornalistas, suamos para conseguir entrevistar a presidente do Comitê Cívico pró-Santa Cruz. Os tais comitês existem em cada uma das 9 províncias bolivianas e são o ajuntamento de diversas organizaçoes da cidade (inclusive a prefeitura e o governo da Província!), sob a batuta de latifundiários e empresários da região. Na hora negociar com o presidente, são eles - que nunca receberam um único voto - que sentam na mesa. E a transformam em balcão, e exigem o que bem entendem.
O chato do assessor nos concedeu cinco minutos com a distinta senhora. Anotou nossos nomes, botou uma banca de importante, disse que andava tendo problemas com entrevistas de estudantes, aquela coisa.
E eis que, caminhando, já de partida, escutamos no microfone: "Vamos saudar a equipe da Globo, de Brasil, que também está aqui fazendo umas imagens, vendo como se faz festa na Pampa."
Do palanque, dondocas nos olhavam, e pela primeira vez abriam sorrisinhos. E o povo, incauto, disse amém mais uma vez. Fomos embora, porque já era meio-dia e sol do sertão vocês sabem bem como é.
Como bom sertanejo, o povo recebeu e aplaudiu, empolgado, a umas boas duas horas de discursos de gente importante e engravatada. Em cada fala, cupinchas da administração e do empresariado local não perdiam a oportunidade de malhar um pouquinho o governo de Evo Morales e pregar um discurso separatista de autonomia. No fim, do próprio prefeito, promessas de um novo hospital para o vosso-reino, em troca de aplausos, sorrisos e mais todo aquele venha-a-nós. Conservando o costume antigo do sertão, em Santa Cruz o povo ainda diz amém.
Disfraçados de jornalistas, suamos para conseguir entrevistar a presidente do Comitê Cívico pró-Santa Cruz. Os tais comitês existem em cada uma das 9 províncias bolivianas e são o ajuntamento de diversas organizaçoes da cidade (inclusive a prefeitura e o governo da Província!), sob a batuta de latifundiários e empresários da região. Na hora negociar com o presidente, são eles - que nunca receberam um único voto - que sentam na mesa. E a transformam em balcão, e exigem o que bem entendem.
O chato do assessor nos concedeu cinco minutos com a distinta senhora. Anotou nossos nomes, botou uma banca de importante, disse que andava tendo problemas com entrevistas de estudantes, aquela coisa.
E eis que, caminhando, já de partida, escutamos no microfone: "Vamos saudar a equipe da Globo, de Brasil, que também está aqui fazendo umas imagens, vendo como se faz festa na Pampa."
Do palanque, dondocas nos olhavam, e pela primeira vez abriam sorrisinhos. E o povo, incauto, disse amém mais uma vez. Fomos embora, porque já era meio-dia e sol do sertão vocês sabem bem como é.