'A grande característica do rádio é a democracia e o papel social', diz a radialista Mara Régia
Muito se discute sobre a sobrevivência do rádio e sua relação com a internet. A questão das mídias digitais como extensão deste meio também está em evidência, entretanto, existem realidades em que o rádio ainda representa o único meio de informação, como na Amazônia. Locais em que a informação passada pelo veículo interfere diretamente no dia-a-dia da comunidade. Papel das inúmeras rádios comunitárias, mas em outra esfera de discussão está a questão da legislação e do real papel dessas rádios.
Mara Régia é produtora e apresentadora dos programas "Natureza Viva", "Viva Maria" e "Trilha Animal", pela Rádio Nacional da Amazônia. Nos anos 70, criou o programa Viva Maria, responsável por mobilizar mulheres em luta de seus direitos. A jornalista e publicitária participa do "IV Seminário Internacional de Radiojornalismo" e fala sobre a paixão pelo rádio.
Portal IMPRENSA - Qual a importância do rádio no contexto social?
Mara Régia - O rádio nasceu de um sonho de se transformar no livro dos que não sabem ler. E eu acho que a grande característica deste meio é a democracia. O letrado, o analfabeto, todos têm acesso. No caso do trabalho que realizamos na Amazônia, o rádio é um meio de comunicação para informar socialmente. As pessoas dependem dessa informação para as coisas mais elementares possíveis: acordos de pesca, negociações de conflitos, questões de saúde. Lá o radio e a única mídia, dificilmente você vê nas emissoras comerciais uma preocupação coma responsabilidade social.
IMPRENSA - De que forma você analisa o conteúdo no rádio no Brasil hoje?
Mara - Hoje temos o jornalismo, muito bom em algumas emissoras. No quadro geral, vemos que, em Porto Alegre, as pessoas são acostumadas a ouvir mais notícias. Em São Paulo, existe uma centralização de jornalismo ligado a grandes grupos. Você tem a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), em Brasília, que também aposta muito no jornalismo. Mas na maioria dos casos vemos que o rádio está muito nas mãos do poder religioso - igrejas pentecostais, católicas, evangélicas. Outras estão a serviço do sucesso fácil, pessoas apostando no humor barato.
IMPRENSA - Como está a questão das rádios comunitárias?
Mara - Muitas pessoas ousam fazer comunicação e estão a favor de proselitismos políticos e religiosos. Essas, não realizam a missão de valorizar a cultura da comunidade e prestar o genuíno serviço social. Faltam rádios que prestem um serviço comunitário, que falem do buraco da rua. Algo que as grandes redes já fazem, mas não de forma regionalizada. No contexto amazônico, por exemplo, precisamos de rádios para avisar que a vacina não chegou. Rádio lá é uma questão de sobrevivência, pois a locomoção e os acessos são difíceis.
IMPRENSA - A legislação ajuda?
Mara - As legislações do jeito que está faz com que as rádios comunitárias vivam amordaçadas. Ela parece ter sido feita para diminuir a importância de uma educação plural, voltada para os interesses da comunidade. Que limita, por exemplo, o alcance. Na Amazônia as rádios só podem ter um quilômetro de alcance. Isso exclui as rádios comunitárias. A lei também proíbe uma freqüência única que engessa e distorce o critério de representatividade, a mudança na lei é fundamental para que possamos pensar em comunicação comunitária no país.
IMPRENSA - E a questão comercial?
Mara - A radio comunitária, só as rádios comerciais que podem visar o lucro e se pautarem na publicidade para sobreviver. As outras, sejam elas educativas, publicas, culturais como as universitárias, todas essas têm que ter um ideal de comunicação que configure uma perspectiva de universalização do conhecimento. Acredito que existe um esforço tentando mexer na programação para se aproximar dessas idéias. Temos boas experiências, fiquei encantada com alguns programas infantis. Na rádio universitária Santa Maria, programa voltado para pessoas com deficiência mental, mas esse pluralismo não é a tônica.
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Publicado originalmente em FNDC
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