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Multiterminais - Uma solução que sai caro....

6 de Novembro de 2011, 0:00 , por Software Livre Brasil - 0sem comentários ainda | Ninguém está seguindo este artigo ainda.
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Faz tempo que eu gostaria de falar sobre esse assunto. Até cheguei a pensar em algum discurso introdutório, de efeito para sustentar meus argumentos. Mas não acho isso necessário. Portanto vou direto ao ponto!

Há algum tempo o governo federal vem investindo “pesado” na compra de computadores para as escolas públicas, no incentivo ao uso das NTICs (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação) na educação etc... Nada seria mais coerente do que o fato de se utilizar e incentivar o uso de softwares livres nesses equipamentos. Essa ideia é brilhante...

No papel!

Na prática, os nossos governantes, secretariados, ministérios e diabos à quatro vem fazendo mais lambanças do que um... Um dos exemplos que trago aqui, é a solução de multiterminais nas escolas públicas.

Multiterminal, para quem não conhece, trata-se de um computador ao qual estão ligados dois ou mais monitores, com seus respectivos periféricos. Você poderá entender melhor se observar a figura abaixo:
Linux: Multiterminais e Userful Multiplier nas escolas públicas: Uma solução 
barata que sai caro
Veja que uma única CPU alimenta dois monitores, dois teclados e dois mouses independentes. Com essa solução cada monitor inicia uma sessão do X, que funcionará de maneira independente à do monitor ao lado. Em alguns computadores, são ligados 3 monitores também.

Pois bem, o que tenho pra dizer sobre esse assunto é que quanto mais a gente crê que um dia a educação será levada a sério, mais a gente vê que ninguém está dando à mínima para ela.

Você deve estar se perguntando o que tem de errado nessa solução aparentemente “genial”. Oras, a solução realmente parece digna de um “Eureka!!!!!”: pode-se economizar em CPUs, podendo-se comprar mais monitores e teclados. Assim um laboratório com 15 máquinas precisará de apenas 5 CPUs. Vê-se que nesse caso, economizou-se o dinheiro de 10 CPUs! É bastante dinheiro. Palmas para quem inventou isso, e mais palmas ainda para quem decidiu comprar milhares dessas coisas para as escolas públicas!

Não preciso dizer que essa “ideia” é muito mais interesseira do que interessante. Não sei quem está ganhando com isso. Mas tenho certeza de que não são as escolas.

A minha escola é uma das felizardas que recebeu um desses laboratórios. No início fiquei de boca aberta e imaginando como seria viabilizar um trabalho pedagógico com esse tipo de tecnologia. Com o passar do tempo só fui confirmando as minhas péssimas previsões.

Vou enumerar alguns dos problemas que esse tipo de “ideia supimpa” acarreta para o professor e seus alunos:

1º Incompatibilidade com a esmagadora maioria de sistemas: Pra falar a verdade um software que não tem compatibilidade com Ubuntu, já não tem serventia nenhuma. Na educação não podemos nos dar ao luxo de usar distros menos populares, pois precisamos de dinamismo e facilidades que só o Ubuntu é capaz de dar. Para fazer o software que gerencia esses multiterminais (userful multiplier) funcionar no Ubuntu foi um verdadeiro parto! No início eu só conseguia fazê-los funcionar no Ubuntu 9.10 ou inferior. No site do Userful Multiplier, constava que esse software era compatível com Ubuntu 10.04, mas ao tentar a instalação, o pacote simplesmente acusava incompatibilidade de versão! Entrei em contato com o suporte do Multiplier, e recebi uma sonora resposta de: “O userful multiplier não funciona no Ubuntu 10.04 nas máquinas do pregão das suas máquinas”!

A resposta é sempre a mesma: “Use o Linux Educacional, que já vem instalado nos multiterminais, blá, blá, blá...". A versão do Linux Educacional que veio instalado nos multiterminais da minha escola, era o 3.0, baseado no Ubuntu 8.04. Três anos de defasagem é muito em se tratando de Linux! O suporte do Ubuntu 8.04 já venceu. Não quero colocar o Linux Educacional nessa história, tenho minhas opiniões sobre ele, mas vou poupá-lo dessa vez.

No final das contas se não fosse o amigo Fernando Amado, desenvolvedor do projeto Guaçú Livre, eu não teria descoberto como fazer o Ubuntu 10.04 funcionar nessas máquinas. O truque está em usar o Ubuntu 10.04 64 bits, com a versão 4.0 do Userful. Mas tem que ser a versão beta, pois a versão final, eles deram jeito de estragar novamente.

2º Desempenho: Sim. Ou você imagina que duas ou três pessoas usando a mesma CPU não irá influenciar no desempenho da mesma? Aí muitos vem com aquela ladainha de: “Ahhhh Gedimar, mas em uma escola, o que os alunos vão fazer para exigir tanto de uma máquina? Eles só vão digitar textos e pesquisar na internet. Isso ocupa só uns 5% do processador e da memória RAM. Ninguém vai nem notar a diferença.”

Esse é o tipo de frase de gente que nunca pisou em uma escola, e se pisou, não tem comprometimento com educação de qualidade. Em uma escola faz-se muita coisa que exige bastante recursos de hardware sim. Quer um exemplo? Jogos em flash: rodar um simples jogo em flash através do navegador já prejudica o desempenho da máquina. Tive péssimas experiências para trabalhar com multimídia, principalmente com vídeos, nessas máquinas.

3º Uso excessivo de memória: Todos sabemos que máquinas com sistema 64 bits usam mais memória que máquinas com sistema 32 bits. Mas as coisas que vejo acontecer com esses multiterminais beiram o sobrenatural! Explico: Algumas máquinas, mesmo sem nenhum programa aberto, consomem todo o 1 GB de memória RAM da máquina! Se listar os processos, não aparece nenhum que esteja consumindo tanta memória.

4º Mau funcionamento dos periféricos: O software usado para gerenciar os multiterminais (userful multiplier) é uma das coisas mais horríveis que já vi. Ele simplesmente faz uma confusão extrema com os periféricos da máquina. Mouses travam, teclados muitas vezes escrevem em letra maiúscula quando o capslock está desligado e em letra minúscula quando o capslock está ligado. O mesmo acontece com o teclado numérico.

5º USB: Pendrives não funcionam corretamente. É um sacrifício para fazê-los funcionar, e quando funcionam, transmitem dados à uma velocidade tão lenta que demora alguns minutos para transferir uma simples música em mp3 para dentro deles. Isso sem contar os problemas de escrita: em algumas máquinas só é possível montar pendrives como root, através do terminal! Isso é um absurdo! No fim de tudo, tive que deixar apenas um dos monitores de cada máquina montando pendrives, os outros tive que colar um enorme aviso escrito “NÃO MONTA PENDRIVES”.

6º Áudio: Fazer o áudio funcionar corretamente nessas máquinas foi mais uma odisseia. Horas não funcionava, horas funcionava invertido. E o caos se estabelecendo cada vez mais.

7º Aceleração gráfica: Jogos que exigem aceleração gráfica? Nem em sonho! Mesmo com um placa aceleradora o userful não suporta aceleração gráfica. Rodar um simples TuxKart é simplesmente impossível!

Em 2009, trabalhei em uma escola em que as máquinas não eram multiterminais. Mesmo com um Celeron e 512 Mb de RAM essas máquinas suportavam aceleração gráfica. Umas das ferramentas que utilizei para fazer propaganda do Linux, foi o Compiz. Os alunos simplesmente babavam! Ficavam maravilhados! Todos nós sambemos, que para conquistar novos usuários para o Linux, o Compiz é uma poderosa arma. Mas com esses multiterminais, nem isso é possível de se fazer.

8º Fechamento inesperado de softwares: Esse é um dos problemas que me dão calafrios! Softwares como o Open/LibreOffice, fecham sem mais nem menos.

9º Complexidade de configuração: Graças a Deus eu tenho o instinto de pesquisador e fuçador, tenho um bom conhecimento sobre Linux. Mas, com toda a humildade, essa não é a realidade da maioria das escolas. A maioria dos professores encarregados pelas salas informatizadas do Brasil mal sabem instalar um programa no Ubuntu, muito menos configurar um multiterminal desses de modo que funcione de uma maneira “tolerável”.

10º (Por fim, porém não menos importante!) Fios: São tantos quanto os cabelos da Rapunzel. Sei que isso não é tão importante, mas eles dão um aspecto feio ao ESPIN (Espaço Pedagógico Informatizado). E depois de tantos problemas, esses detalhes acabam se tornando irritantes!

Sem dúvida a maior questão desse problema é a própria aprendizagem do aluno. Mas tem um outro problema que inevitavelmente acaba por acontecer, que é a contribuição para com que a imagem do Linux, perante o usuário leigo, fique cada vez mais arranhada. Isso é péssimo. O usuário final não quer saber se o Userful, se o Xorg, se X, se o USBmount, blá blá blá... Ele quer fazer o que tem que fazer, sem ver o programa em que ele está trabalhando simplesmente fechar na sua cara, sem nenhuma explicação.

Gostaria de salientar algo muito importante, pois sempre que alguém lança uma crítica em relação aos recursos disponibilizados à educação, sempre aparece um “pano quente” com aquele discurso xôxo:

“Mas quem quer ser educador tem que trabalhar com o que tem à disposição”
“Ahh, mas professor tem que fazer muito com o pouco”
“É, mas as coisas são assim mesmo. Educação é sacrifício”

E outras coisas mais...

Eu me recuso a ouvir esse tipo de gente. É bem verdade que nós não devemos deixar de fazer as coisas por falta de recursos, afinal de contas o nosso aluno não tem culpa se os nossos governantes se preocupam mais com copa do mundo e olimpíada do que com educação. Devemos sim, fazer o nosso melhor com o que temos em mãos

Mas daí aceitar as coisas como um cordeirinho, ver as coisas acontecendo de maneira errada e nem ao menos se posicionar ou reivindicar melhorias, já é falta de responsabilidade e de senso crítico.

Quero deixar claro que eu critico, pois tenho uma argumentação baseada na experiência.  Sou especialista em Linux, mas os anos de intensa aprendizagem que tive sobre esse sistema me gabaritam a opinar sobre algo que visivelmente não funciona de maneira satisfatória.

Também não sou do tipo que cruza os braços e fica apenas reclamando. Quem me conhece sabe do meu esforço para poder integrar cada vez mais o software livre e as NTICs ao processo de ensino e aprendizagem, tenho muito a aprender, mas graças a Deus também tenho muito com que posso contribuir.

Sei que as minhas palavras podem ofender algumas pessoas. Sei que eu posso pagar por causa disso. Mas eu me sinto na obrigação de denunciar o descaso com que a educação, e principalmente que as NTICs aplicadas à mesma são tratadas pelos poderosos.

Abraço a todos.
 

 


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