Por Josias Pires para o Bahia na Rede
A Bahia é o primeiro estado brasileiro a criar um Conselho de Comunicação, em processo de implantação, de caráter deliberativo com a finalidade de formular e acompanhar a execução da política pública de comunicação social.
“A Bahia tem papel fundamental neste momento no sentido da participação popular na gestão da comunicação. Todos os estados têm expectativa do que acontecerá aqui”, afirmou o professor da Universidade de Brasília (UnB), Venicio Lima, um dos principais estudiosos da economia política das comunicações no Brasil, durante debate na sexta-feira (22) no seminário “Marco Regulatório e Políticas Locais de Comunicação na Bahia”, realizado pela Frente Baiana pelo Direito à Comunicação, com o apoio da Secretaria de Comunicação Social da Bahia.
O professor acredita que “não devemos esperar muito das políticas nacionais na área da comunicação, mas sim das políticas locais”. Depois da Constituição de 1988 dez estados da federação incluíram nas suas constituições estaduais artigos sobre a criação de conselhos de comunicação. A Bahia é o primeiro estado que regulamenta a criação do conselho, que tem poder deliberativo sobre a formulação de políticas públicas de comunicação no estado e está em processo de implantação.
Ao contrário do que diz a grande mídia, contestou o professor, os conselhos de comunicação buscam ampliar o direito à comunicação, a ampliar a liberdade de comunicação, ou seja, a garantir que mais vozes da sociedade sejam ouvidas. No caso da Bahia, o Conselho terá 1/3 de representantes da sociedade civil, 1/3 de empresários e 1/3 de representantes do governo.
Venício Lima palestrou na mesa “Participação Social e Conselhos de Comunicação”, ao lado do secretário Robinson Almeida; e da doutora em Ciências Sociais e Políticas (Flacso), Gislene Moreira. E começou perguntando o “que está em jogo, do ponto de vista político, com a instalação de conselhos, como os de comunicação”? Perguntou para responder: “A democracia liberal representativa está em crise no mundo inteiro”.
No Brasil, continua, há tempos ocorrem movimentos isolados que apontam para a realização do desejo da democracia participativa, com a ampliação da participação popular na formulação e gestão de políticas públicas, como se vê na área da saúde e em experiências de orçamento participativo.
Tais perspectivas deságuaram na Constituição de 1988, que “consagra esta perspectiva de descentralização e dos conselhos”, fortalecendo os de saúde e estimulando os de educação, cultura e outros. Mesmo na Constituinte o conselho de comunicação não teve o mesmo tratamento que os demais. A comunicação não era visto como direito social, lembra Venício Lima.
Por isto é notável quando comparamos avanços na gestão pública compartilhada dessas políticas sociais – saúde e habitação, por exemplo, com todos os limites – com os das políticas de comunicações, onde as empresas continuam ditando as regras e fazem de tudo para deslegitimar o movimento pela democratização e evitar um novo marco regulatório para o setor. O código em vigor é de 1962, antes da TV a cores.
“A crise da democracia representativa está sendo evidenciada pelos movimentos que usam formas de comunicação alternativas como instrumentos de mobilização social. Tem algo acontecendo em relação à democracia representativa, como também a participação tem se manifestado por novos meios e novas formas de comunicação”, refletiu.
No caso do Brasil, acrescenta, “tudo isto ocorre em meio a uma história política refratária ao aprofundamento da democracia. O liberalismo brasileiro do século XIX não é democrático. A nossa democracia sempre foi excludente. A democracia participativa encontra resistência muito grandes no Brasil”, afirmou.
Aprofundando a crítica à ideologia liberal que circula no Brasil, Venicio Lima lembra que, no caso do debate da comunicação, o liberalismo brasileiro “faz o argumento inverso: qualifica o movimento de democratização de anti-democrático”, travando o debate sob o argumento de que as forças democráticas querem “censura”, numa evidente tentativa de manipular o debate.
Os liberais da política e da imprensa brasileira preferem desconhecer que a agência reguladora da radiodifusão nos Estados Unidos existe desde 1934. O recente episódio na Inglaterra com um dos jornais do Murdoch prova que a auto-regulação não resolve tudo no campo da imprensa, sem falar nos problemas do direito de resposta no Brasil.
Mas o foco agora é a regulação da radiodifusão (rádio e TV), pois o mercado tornou-se monopólio de algumas famílias e igrejas que têm menos bala na agulha do que as empresas de telecomunicações, que querem entrar no setor produzindo e distribuindo conteúdo não só para celulares como também entrando no mercado da tv comercial. A primeira regulação do setor é a do mercado. É o choque de capitalismo na mídia.
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