Por Patricia Knebel para Infosurhoy.com – 18/08/2011
PORTO ALEGRE, Brasil – Com os rostos pintados de verde e amarelo, os jovens brasileiros foram às ruas nos anos 90 para somar vozes ao processo democrático que resultou no impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello.
Duas décadas mais tarde, em plena era digital, protestos divertidos ganham impulso pela Internet.
Bastam alguns cliques para que as novas gerações se aproximem em redes sociais e organizem manifestações. O poder da web é usado para angariar adeptos das mais diversas causas, dizem especialistas.
Esse potencial é proporcional à expansão de usuários de redes sociais no país. Só o Facebook já tinha cerca de 23 milhões no início de agosto – em fevereiro eram pouco mais de 12 milhões –, segundo o site de estatísticas Social Bakers.
“A Internet aproxima e conecta pessoas com pensamentos parecidos”, diz Luiz Felipe Coruja, filósofo de 27 anos. “Os jovens estão cada vez mais online e podem optar entre usar esse tempo para os games ou para se mobilizar em torno de uma causa social.”
Coruja foi um dos organizadores da Marcha da Liberdade em Porto Alegre. A mobilização, organizada via Internet, teve passeatas em diversas capitais brasileiras em 18 de junho. Os participantes reivindicavam desde o uso consciente dos recursos naturais, à liberdade sexual e de pensamento e mais segurança.
“A marcha é uma construção coletiva e independente”, comenta Coruja. “São apenas pessoas, com diferentes opiniões, mas também com um ponto de vista em comum.”
A consolidação da democracia, o aumento do acesso à educação formal e os direitos conquistados a partir da Constituição Federal de 1988 encorajam a população a expor cada vez mais sua opinião, afirma Hermilio Santos, professor de Sociologia e Política da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
“A tecnologia facilita e amplia essas manifestações, especialmente através das redes sociais como Facebook e Twitter”, completa. “Mas a tecnologia não faz nada sozinha.”
O mundo está vivenciando novas formas de organização das pessoas em rede, afirma Marcelo Branco, especialista em estratégias para a Internet. Trata-se de uma capacidade de mobilização e manifestação – ou até revolução, como aconteceu esse ano na Tunísia, Egito, Síria e Líbia – diferente da construída na era industrial, baseada em partidos políticos, sindicatos e outras estruturas de poder ou contra poder.
“A revolução digital empoderou os indivíduos de uma forma que ainda não tínhamos visto”, destaca Branco, que foi o responsável pelas ações de Internet durante a campanha da presidente Dilma Rousseff em 2010.
Uma característica peculiar dos movimentos na web é que não existe hierarquização, diz Branco. As ações ocorrem por engajamento, e as alianças não são permanentes.
Um cidadão pode se unir a um grupo na defesa de um ideal pela manhã e, à noite, já estar com novos aliados em prol de outro objetivo, completa Branco. “Os jovens estão questionando os limites da democracia”, diz. “Essas mesmas ferramentas da Internet que servem para mobilizar nos dão pistas de como a nova democracia do século 21 está sendo construída.”
Cada geração usa linguagens e ferramentas singulares para se expressar, explica Ivana Bentes, professora e diretora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“O mais importante é que estamos vendo que as redes têm um potencial de intervenção e mobilização que ultrapassa a opinião e pode se materializar em ações bem concretas de pressão de organização social”, afirma.
A mobilização para o esclarecimento do Projeto de Lei 84/99 – o chamado“AI-5 Digital” – é apontada por Ivana como uma ação bem sucedida no campo do ciberativismo no Brasil.
Ao tipificar os crimes cometidos pela Internet, o texto também criminaliza práticas de compartilhamento de conteúdos online – música, por exemplo – e restringe o direito à privacidade dos usuários.
A proposta, em tramitação na Câmara de Deputados, tem provocado reações negativas em todo o país. Uma petição contrária ao texto, com 163.000 assinaturas, foi entregue em julho ao presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, deputado Bruno Araújo (PSDB-PE).
“Essa proposta cria uma cultura de criminalização na Internet antes mesmo que tenhamos um Marco Civil para a Internet que estabeleça, em primeiro lugar, os direitos na rede”, diz Ivana.
Em elaboração pelo Ministério da Justiça, depois de consulta pública à sociedade em 2010, o texto que estabelece o Marco Civil da Internet, com direitos e deveres de usuários e provedores, deve ser encaminhado ao Congresso até agosto.
“Os novos movimentos estão resgatando o desejo e o prazer da luta por objetivos comuns”, encerra Ivana.
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